Friday, November 28, 2008

a construção da dignidade

"Os direitos humanos são uma janela através da qual uma certa cultura visualiza uma ordem humana justa para os seus indivíduos. Mas os que vivem nessa cultura não vêem a janela. Para isso necessitam do auxílio de outra cultura que vê através de outra janela. Creio que a paisagem humana vista através de uma das janelas é simultaneamente semelhante e diferente da que se vê da outra. Sendo assim, devemos nós estilhaçar as janelas e fazer das várias portadas uma única abertura - com o consequente risco de colapso da estrutura - ou devemos antes alargar tanto quanto possível as vistas e, sobretudo, tornar as pessoas cientes de que há - e tem que haver - uma pluralidade de janelas?" (Raimon Pannikar)

Wednesday, November 26, 2008

get back

O L'Osservatore Romano , porta-voz do Vaticano, demorou 42 anos a distanciar-se do anátema lançado sobre John Lennon e a sua opinião de que os Beatles seriam mais famosos que o cristianismo. Não sei se algum dia o Vaticano adoptará as mensagens de "Imagine" e de "Give Peace a Chance" como grandes testemunhos de humanidade. Se o fizesse, seria um sinal dos tempos.

Monday, November 24, 2008

em meu nome não

Amanhã lembramos todas as mulheres anónimas que vivem o pesadelo diário de saber que o seu companheiro tem uma arma na gaveta mais próxima. Amanhã lembramos os 80 milhões de mulheres que´, só no espaço da União Europeia, já foram alguma vez vítimas de violência doméstica. Hoje, amanhã e sempre tem que haver homens que digam publicamente "EU NÃO SOU CÚMPLICE" dessa cobardia miserável que é a da violência contra as mulheres por serem mulheres.

Friday, November 21, 2008

julgar

Não, o juízo dos juízes não é o final. Mas acusar e julgar são tarefas de importância social crescente. Acusar competente e corajosamente todos os que infringem a lei e não apenas os que não conseguem escapar. Julgar com bom senso e sentido de justiça e não apenas com domínio da engenharia processual. Defender assim a democracia, mesmo sabendo que ela será sempre, por definição, descontente - essa é a missão fundamental dos juízes.

Wednesday, November 19, 2008

é verdade

Há dois olhares sobre o diálogo inter-religioso. Um é táctico. Dá importância ao diálogo inter-religioso porque o acha necessário para prevenir turbulências e integrar imigrantes sem fazer ruir a "coesão nacional". O outro é desinteressado. Dá importância ao diálogo inter-religioso porque o acha inerente à incompletude de todas as religiões. Ah, é verdade, também há os que acham o diálogo inter-religioso como uma fraqueza de quem não defende a sua religião como deve ser.

Monday, November 17, 2008

marx

Karl Marx anda por aí. Há novos manifestos em germinação, com a precariedade, o sexismo, os novos racismos ou os velhos colonialismos como terrenos férteis. No congresso este fim de semana realizado em Lisboa, Marx falou e ouviu as mais distintas narrativas. Mas não consta que alguém tenha ensaiado um diálogo com ele a partir do cristianismo. Há muros e inércias que ficam.

Friday, November 14, 2008

congo

Cinco milhões e meio de mortos numa década. São tutsis contra hutus? Não, são diamantes, ouro, cobalto e outras riquezas contra todos. No Congo (como em todos os Congos do mundo), vão-se debitar receitas de boa governação de brancos para pretos e vai ouvir-se a enésima voz que clamará "eu não sou racista, mas a verdade é que há povos que não se sabem governar". Fica sempre por exigir a boa governação dos países ricos, fica sempre por exigir o controlo apertado dos movimentos de recursos minerais, fica sempre por exigir o controlo dos fluxos de armas. A boa consciência tem destas coisas.

Wednesday, November 12, 2008

blindness

Vemo-nos e, por isso, sabemo-nos iguais. Fosse o branco da cegueira o conteúdo do nosso olhar e justificar-nos-íamos como monstros. Mas quando olhamos vemos? Ou, mesmo vendo, somos cegos? Ou, mesmo sabendo-nos iguais, queremo-nos aniquiladores?

Monday, November 10, 2008

seminários

Os seminários são alternativa a uma sociedade incultamente distraída do densamente humano ou são disso complemento? São escolas de conservação ou de transformação? Formam para um diálogo exigente entre fé, ciência e cultura ou para uma ruralidade nostálgica? Questionam o vocabulário e os gestos que a sociedade ouve e vê como gastos ou reproduzem-nos? Ensinam a ver as vidas como elas são ou aprisionam-nas em códigos tão rígidos quanto mortos?

Friday, November 07, 2008

o teste

"Aceitará Obama que o racismo seja normal quando se exerce contra os países que o seu país invade? Não é racismo contar um por um os mortos invasores do Iraque e ignorar olimpicamente os muitíssimos mortos na população invadida? Não é racista este mundo em que há cidadãos de primeira, de segunda e de terceira categoria, e mortos de primeira, de segunda e de terceira? A vitória de Obama foi universalmente celebrada como uma batalha ganha contra o racismo. Oxalá ele assuma, nos seus actos de governo, essa bela responsabilidade." (Eduardo Galeano, aqui)

Wednesday, November 05, 2008

change

"Hoje, na noite do mundo e na esperança da Boa Nova, eu afirmo com audácia minha fé no futuro da humanidade. Recuso crer que as circunstâncias actuais tornem os homens incapazes de fazer uma terra melhor. Recuso crer que o ser humano não seja mais do que um boneco de palha agitado pela corrente da vida, sem ter a possibilidade de influir minimamente no curso dos acontecimentos. Recuso-me a partilhar a opinião dos que pretendem que o homem está de tal maneira prisioneiro da noite sem estrelas, da guerra e do racismo, que a aurora luminosa da paz e da fraternidade não possa nunca tornar-se realidade. Recuso fazer minha a predição cínica daqueles que dizem que os povos mergulharão, um após outro, no turbilhão do militarismo, até o inferno da destruição termonuclear. Eu creio que a verdade e o amor incondicionais terão efectivamente a última palavra. A vida, ainda que provisoriamente derrotada, é sempre mais forte que a morte. Eu creio firmemente que, mesmo no meio das bombas que explodem e dos canhões que troam, permanece a esperança de um amanhã radioso. Ouso crer que, um dia, todos os habitantes da terra poderão receber três refeições por dia para a vida de seu corpo, a educação e a cultura para a saúde de seu espírito, a igualdade e a liberdade para a vida de seus corações. Creio, igualmente, que um dia toda a humanidade reconhecerá em Deus a fonte do seu amor. Creio que a bondade salvadora e pacífica um dia será lei. O lobo e o cordeiro poderão repousar juntos, todo homem poderá sentar-se sob a sua figueira, na sua vinha e ninguém terá motivo para ter medo. Creio firmemente que triunfaremos." (Martin Luther King)

Monday, November 03, 2008

tarde e mal

O Primeiro-Ministro descobriu agora que o FMI tem "falta de representatividade e de credibilidade". Chega tarde e mal à descoberta. O problema, para Sócrates, é que o FMI "não soube lidar com a crise financeira internacional". Esquece-se Sócrates que não foi na falta de solução mas na geração do problema que o FMI ganhou protagonismo. Porque o problema, ao contrário do que diz Sócrates, não é a derrocada das bolsas, o problema são os 13 milhões de africanos ameaçados pela fome, os 200 mil meninos de rua do Brasil, os 25 milhões de deslocados internos ou os 10 milhões de refugiados por causa dos conflitos armados. Desse problema o FMI foi autor e nunca "remediador". E quem não denunciou isto é que tem falta de credibilidade para se queixar.