Friday, September 29, 2006

défices

Há menos gente nas universidades portuguesas. Por falta de gente, mas sobretudo por falta de esperança. Não chegará nunca proclamar a prioridade política da educação e da frmação. Não chegarão nunca os programas de sedução para a Matemática ou para qualquer outra área. Para lá de todos os paliativos, o que está à vista é a expressão de uma sociedade que vê no seu futuro algo inevitavelmente mais desanimador do que o seu presente. É, pois, de reinvenção esperançada do futuro que se trata. De nada menos que isso. Que lugar tem esta preocupação nas nossas comunidades?

Wednesday, September 27, 2006

dialogar

A diferença é sempre um desafio. A diferença religiosa é um enorme desafio. Porque do absoluto que é Deus é fácil fazer resultar que os diferentes de nós vivem em erro e ignoram a verdade. A nossa. O grande desafio do diálogo entre as religiões é o da recusa da solução fácil de tudo medir pelas certezas e verdades de cada uma, sem nunca abandonar as convicções fundas que as formam. É algo que exige muito estudo, muita capacidade de escuta e uma mistura sábia de humildade e firmeza. É isso uma prioridade para as nossas comunidades?

Monday, September 25, 2006

manifesto

"(D)eve recordar-se, antes do mais, um princípio (...). É o princípio da prioridade do 'trabalho' em confronto com 'o capital'. Este princípio diz respeito directamente ao próprio processo de produção, no qual o trabalho é sempre causa eficiente primária, enquanto o capital, sendo o conjunto dos meios de produção, permanece apenas instrumento, ou causa instrumental." Esta é uma passagem do nº 12 da Encíclica Laborem Exercens, publicada por João Paulo II faz por estes dias vinte e cinco anos.

Friday, September 22, 2006

o debate

Um novo ano lectivo, os debates de sempre: colocação de professores, encerramento de escolas, segurança. Muito pouco sobre o essencial: educar para quê? A pergunta é um desafio aos cristãos. Os nossos filhos são, na escola, sujeitos de competição ou contra-sinais de cuidado? Os nossos filhos hão-de sair da escola para triunfar na selva ou para serem cidadãos sérios e críticos? Pensa-se nisto nas nossas comunidades?

Wednesday, September 20, 2006

repartir

Por estes dias, o país discute o futuro da segurança social. É assunto técnico, pois claro. Mas não sirva isso de desculpa para o alheamento dos cristãos. Como se algum assunto humano não envolvesse opções técnicas... É o respeito pelos mais pobres e pelos mais vulneráveis que está em jogo. Os números, as contas, as políticas, hão-de ser, por isso, ser lidas à luz de critérios de mais ou menos solidariedade. E aí se diferenciarão as várias propostas. Os cristãos não são neutros em justiça e em amor aos pobres.

Monday, September 18, 2006

re-ligar

É preciso dizer, vezes sem conta, que religião e violência não podem nunca ir de mãos dadas. É preciso clamar, sem cansaço, que nenhuma religião transporta no seu código genético uma convocação ao ódio e à espada. É preciso reconhecer, sem medos nem soberbas, que nenhuma religião está limpa de desvios tresloucados de guerra contra os infiéis. É preciso carregar essa cruz e fazer a paz.

Friday, September 15, 2006

cronómetro social

O tempo acelerou vertiginosamente: informação em tempo real, empresa na hora, correspondência instantânea com o outro lado do mundo. Ao mesmo tempo, há quem desespere por um cuidado médico, por um despacho do tribunal ou apenas por um salário que teima em não vir. A justiça passa cada vez mais pelo acesso real ao controle do tempo. A Igreja proclamou há muito o princípio do destino universal dos bens. O tempo, esse bem tão disputado, também é para todos.

Wednesday, September 13, 2006

grande superfície

No mesmo shopping em que alunos universitários são caixas no supermercado, há famílias cristãs que passeiam tranquilamente, vendo as montras. No mesmo shopping em que trabalham pessoas sem subsídio de refeição, com um só dia de folga e sem descontos para a Segurança Social, há cristãos que compram o telemóvel da última geração, para substituir outro, comprado há só três meses. O exame de consciência caíu em desuso.

Monday, September 11, 2006

onze de setembro

Hoje vão dizer que há religiões talhadas para a violência. E esquecerão os pacíficos. Hoje vão repetir que há civilizações do ódio. E ignorarão os amantes. Hoje vão proclamar que, em nome dos nossos, temos que combater os outros. E não falarão dos laços e das misérias que nos unem. Hoje analisarão estratégias e doutrinas. E não cuidarão das lágrimas.

Friday, September 08, 2006

juntos

Fizeram vinte e cinco anos de casados. Juntaram amigos, crentes e não crentes. E disseram que a maior das fidelidades é a que se joga, no dia-a-dia, num projecto de vida comum. Disseram que, num tempo em que tudo é descartável, manter viva a chama desse projecto comum não é coisa fácil. E que, diante dessas dificuldades, ser crente não é uma aspirina mas um factor mais de exigência. Nesse dia, os amigos, crentes e não crentes, gostaram um pouquinho mais da vida.

Wednesday, September 06, 2006

descartável

Passou junto à minha secretária, vergada ao peso do caixote com os últimos papéis que faltava levar. Queixou-se de que tanto peso era duro. Mas depois desabafou: "não, o que é duro é ter que me ir embora ao fim de tantos anos porque já não precisam de mim." Fui incapaz de dizer o essencial: que nenhum de nós deixou de precisar dela e que estamos todos tolhidos, com medo de que, um dia, invoquem essa mentira para justificar o nosso desemprego.

Monday, September 04, 2006

sem som

O Líbano vai desaparecer das notícias. Como desapareceu Timor e antes dele o Darfur. Não haverá câmaras para filmar a dor e a revolta de quem foi poupado pelas balas mas ficou com a vida destruída. Não haverá reportagens que falem, mais do que dos deslocados de guerra, daqueles para dentro de quem a guerra se deslocou, como escreveu Mia Couto. Nada disso é sensacional. Mas o silêncio que isso impõe é que é o mais terrível de tudo.

Friday, September 01, 2006

back

Terminou a pausa. O mundo, a vida, não se evaporaram. Fomos nós que os pusemos em suspenso por uns dias. E agora voltam os desânimos e os entusiasmos, volta o trabalho, volta a política, volta a dureza dos dias comuns. É agora que ganha ainda mais sentido a arejada afirmação da Gaudium et Spes, de 1965: "As alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos homens de hoje, sobretudo dos pobres e de todos os que sofrem, são também as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos discípulos de Cristo."